- Amor, acorda!
- Ahn?...
- Ana, amor, acorda!
- Que é que foi?
- Amor, você sabe que dia foi hoje?
- Ah, Bruno! Não vai dizer que você me acordou só pra perguntar que dia foi hoje!
- Foi quinta-feira, amor.
- Quinta-feira? Tá. Então significa que amanhã é sexta-feira e se eu não dormir agora não vou conseguir ir trabalhar. Boa noite.
- Amor, a gente tinha combinado. Quinta-feira é dia de discutirmos a relação.
- Ah, não dá pra deixar para amanhã?
- Não, Anita, tem que ser hoje. Não podemos quebrar o combinado logo no primeiro dia.
- E se a gente transferir para sexta-feira?
- Sem chance. Já somos adultos o suficiente para cumprirmos o que nos dispomos a fazer.
- Ah, meu senhor... Já vi que não tem jeito, NE?
- Não.
- Ai, ai... Então tá, né? Vai. Começa.
- Hum... Bom, eu fiz um roteiro de perguntas que devemos fazer um ao outro para começar, o que acha?
- É... Bem a sua cara...
- Caham! Primeira pergunta: Ana, durante esta semana ou em qualquer outro momento de nossas vidas, eu fiz algo que você não gostou?
- Não, Bruno. Não fez nada.
- Ótimo! Agora é sua vez!
- Vez de quê?
- De me perguntar, ué!
- Perguntar o quê, Bruno?
- Se você fez alguma coisa que eu não gostei.
- Ah... Eu fiz alguma coisa que você não gostou?
- Quando? Determine o tempo.
- Ah, sei lá, Bruno! Qualquer dia!
- Hum... Bom... Na verdade, fez sim.
- O quê?
- É que eu não gosto quando você chega em casa, vai pra cama e dorme sem mal falar comigo.
- Eu chego cansada do trabalho, meu amor.
- Eu sei, eu sei. Mas eu espero você chegar, todo feliz e com saudades e você age como se eu não tivesse importância na sua vida.
- Meu amor, você é a coisa mais importante da minha vida.
- Então promete que vai tentar mudar?
- Eu posso tentar...
- Porque este é o objetivo de discutirmos a relação.
- Ok... Eu prometo que vou tentar.
- Ótimo! Segunda pergunta: eu tenho alguma mania e hábito que você ache irritante u feio?
- Hum... Não que eu me lembre.
- Agora faz a pergunta.
- Ahm... Eu tenho alguma coisa que irrite você?
- Bom... Eu não gosto muito quando você deixa suas calcinhas penduradas no chuveiro.
- Bem, eu também odeio quando você deixa o chuveiro no inverno.
- Então por que não falou quando eu perguntei?
- Porque eu acho que faz parte do casamento suportar algumas coisinhas.
- Mas é pra isso que estamos discutindo a relação, Anita! Pra tentarmos mudar as pequenas “coisinhas” que podem desgastar nosso amor!
- Ai, tá bom! Não grita!
- Não tô gritando!
- ...
- Além do chuveiro, tem alguma outra “coisinha”?
- Essa sua mania de usar minhas palavras contra mim.
- Eu não estou “usando suas palavras contra você”.
- Aí! Tá fazendo de novo!
- Não estou!
- Não grita!
- Humf!
- ...
- ...
- Acalmou?
- Eu não estou nervoso.
- Que bom. Terminamos?
- Não. Já que começamos a falar de manias irritantes, vamos falar da sua mania de não lavar os pés antes de deitar.
- O que tem isso?
- Tem que eu acho nojento dormir na mesma cama de um par de pés sujos.
- Se não gosta, vai dormir na sala.
- Anita, não é por aí! Você tem que prometer tentar mudar!
- Ah, Bruno! Eu agüento tanta mania irritante que você tem e você não pode agüentar umazinha minha, que seja?
- Será que você não percebe que estamos discutindo justamente para mudar algumas ações e melhorar nosso relacionamento?
- Bruno, nenhum relacionamento é perfeito.
- Justamente! O nosso pode ser!
- Se nenhum relacionamento é perfeito, o nosso não pode ser. Se for perfeito não será mais um relacionamento.
- Isso, na teoria. Na prática dá pra ser.
- Ah é? Então porque você não joga fora aquela sua camisa velha e mofa?
- Eu não posso fazer isso. Aquela camisa foi autografada pelo Clint Eastwood. Tem um valor inestimável.
- Não deixa de ser uma camisa velha.
- Você não entende o valor de um autógrafo.
- O cara só rabiscou lá. Nem dá pra saber se tá escrito “Clint Eastwood” ou o hino da França de trás pra frente.
- Mas é um rabisco do Clint! Sinto muito, mas não posso jogá-la fora.
- Então eu também não posso lavar os pés antes de dormir.
- Isso é completamente diferente.
- Não vejo nenhuma diferença.
- Lavar os pés é uma medida de higiene. A camisa é uma relíquia!
- A camisa é um criadouro de traças!
- E os seus pés são transportadores de germes!
- Larga de ser maníaco, Bruno!
- Pára de implicar com o Clint!
- Não tô implicando com o Clint! Só não agüento mais essa camisa nojenta!
- Não é nojenta! Você por acaso diria que o Santo Sudário é um pano velho e nojento?
- Bruno, é completamente diferente.
- Não vejo diferença nenhuma.
- Tem toda a diferença.
- Você não me entende.
- ...
- ...
- Olha, dá pra gente dormir?
- Vai, Ana! Dorme! Não tô impedindo!
- Amor, eu tenho que levantar cedo para trabalhar.
- Já falei que não estou impedindo!
- ...
- ...
- Desculpa.
- ...
- Eu prometo que vou começar a lavar os pés antes de dormir, certo?
- Eu não vou jogar o Clint fora.
- Não precisa. Eu sei que é importante pra você.
- Jura?
- Aham.
- Ah, Ana! Eu amo você!
- Eu também amo você.
- Prometo que vou começar a voltar o chuveiro pro verão quando eu terminar o banho, tá?
- Isso. Obrigada. Agora vou dormir, tá?
- Tá! Quinta que vem a gente continua.
- Boa noite.
- Boa noite!
- ...
- ...
- Bruno...
- Oi.
- Mas bem que você poderia jogar aquela camisa velha fora, né?