sexta-feira, 7 de maio de 2010

[Marina Morena - parte III]

Roberto acordou na manhã seguinte com o sol batendo na cara. Levantou-se, pegou o retrato e, com um beijo, devolveu-o à gaveta.
Vestiu uma calça jeans e, ao abotoá-la, percebeu que ainda estava com a aliança no dedo. Suspirou e tentou tirá-la. A aliança não saiu.
Roberto repetiu a tentativa várias vezes, puxando a aliança com tanta força que quase provocava feridas em seu dedo. Entrou no banheiro, em desespero. Passou sabonete no dedo, na esperança de que a aliança saísse.
A campainha tocou. “Merda! Merda! Merda!”
Sem pensar, enrolou uma toalha na mão e foi atender à porta.
- Nossa, Beto! Que cara é essa? - Marina perguntou, ao se deparar com o olhar assutado de Roberto.
- Marina? Você, aqui, a essa hora?
- É... Eu sei que é cedo. Acordei você?
- Não, não... Eu não consegui dormir muito essa noite...
- É... Nem eu. Fiquei a noite toda preocupada, com medo de alguma coisa sair errada hoje à noite.
Ela entrou no apartamento, como já fizera tantas vezes.
- Cê... Cê num devia estar se arrumando para o casamento?
- Ainda são sete da manhã, o salão só abre às nove.
- Ah...
- Tava lá em casa, aí me deu vontade de vir te visitar. Sabe essas coisas que a gente não sabe explicar?
- Aham...
Marina estava sentada na cadeira em frente à mesa. Roberto tentava esconde a mão esquerda atrás do corpo.
- Que você tá escondendo aí? - Marina se levantou, indo em direção a ele.
- Ah, nada... Nada... - Roberto tentava desviar. Marina puxou seu braço, vendo a toalha enrolada na mão.
- Que aconteceu? Cê se cortou?
- Ahn... É... Foi... Um cortinho bobo...
- Deixa eu ver isso.
- Imagina, Marina... É um cortinho pequeno, nem sangrou muito...
- Sei... E eu não te conheço? Você é capaz de morrer de hemorragia antes de pedir ajuda pra alguém.
Com um golpe certeiro, Marina arrancou a toalha da mão de Roberto. Ele tentou escondê-la, puxando para fora do alcance de Marina.
- Ei! - Marina segurou seu braço – Desde quando cê tá de aliança? Casou e não me avisou, foi? - ela riu.
Roberto ficou calado. Ele apenas a olhava nos olhos, e tinha culpa no olhar.
O sorriso de Marina se fechou aos poucos. Ela olhou sobre a mesa, vendo a caixinha fechada.
- Que é isso? - ela pegou a caixinha, abriu-a e pegou a aliança que sobrara. - Paulo? Como assim, “Paulo”? Essa é a minha...? - ela apontou para a mão de Roberto. Ele permaneceu em silêncio. - O que que ela tá fazendo aqui?
- O Paulo... Foi o Paulo... Ele... pediu pra eu levar para a igreja...
- E o que que essa daí tá fazendo na sua mão?
Roberto não respondeu. Olhava fixo para a caixinha, como se dela fossem sair respostas que o ajudassem a escapar daquela situação.
- Por que você tá com a aliança do Paulo no dedo? - ela repetiu.
Ele continuou em silêncio.
- Roberto, fala! - ela começou a ficar impaciente.
- Eu... eu só quis ver... como ficava... em mim...
- Por quê? - ela inquiriu.
- Só quis ver... só ver...
- Roberto, por que você pôs a minha aliança?
- Eu... - ele levantou o olhar para ela.
Por alguns instantes houve um silêncio absoluto entre os dois.
- Beto... você...?
Os olhos de Roberto se encheram de lágrimas. Lentamente, ele balançou afirmativamente a cabeça.
Marina desviou o olhar, dando voltas no quarto.
- E porque você... nunca... nada...?
- Não dava... não podia... não posso...
Marina o encarou, também com lágrimas nos olhos.
- Desde quando?
- Eu... sempre... o Paulo...
- Por que nunca, Beto?
- Não podia, caramba! O Paulo é meu amigo!
- E antes, Beto?
- Não conseguia! Você é minha amiga!
Marina se afastou, olhando pela janela.
- Mas isso não muda nada... Nada, Marina...
- Como não muda nada, Beto?
- Hoje à noite você vai para a igreja, vai se casar com o Paulo e eu vou ficar feliz com isso porque você vai estar feliz e é isso que importa pra mim.
- Como eu posso me casar com o Paulo agora, Beto?
- Isso não faz a menor diferença. Nunca fez. Sempre foi assim...
- Mas antes eu não sabia! Você não tinha me contado! Se você tivesse...
- Ia mudar alguma coisa, Marina? Se eu tivesse contado antes, você teria terminado com o Paulo para ficar comigo? Você ia milagrosamente dizer que me amava e a gente ia se casar e ser felizes para sempre, por acaso?
- Eu não sei! Eu não sei! Você devia ter me contado, eu precisava saber... Eu queria saber... Eu...
- Pára, Marina! Cala a boca! Me ajuda a tirar essa porcaria de aliança do dedo senão você vai se atrasar!
- Era pra ser você, sabia?
Roberto a encarou.
- Como assim?
- Hoje... Lá na igreja... Essa aliança...
- Marina, pára! Cê tá falando bobagem! Me ajuda a tirar essa merda do meu dedo antes que...
- Era você antes do Paulo. Mas eu achei que você não... Que você nunca... Se você tivesse me contado...
- Pára! Pára! Eu não quero ouvir! Vai pra igreja! Vai, some daqui! Sai!
Marina o abraça.
- Pára! Me solta! Pára, Marina! Pára... Pára...
Os dois se beijam longamente. Ao final do beijo, eles se afastam sem se olhar. O silêncio dura por vários minutos.
- Você deve casar com ele. - Roberto diz, firme.
Ela permanece em silêncio.
- Você quer se casar com ele? - ele pergunta.
Finalmente, ela responde.
- Quero.
Os dois se olham, com sorrisos tristes.
- Então, me ajuda a tirar essa aliança. 

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