sexta-feira, 7 de maio de 2010

[Memórias de Calvário]

Postado originalmente em 21 de maio de 2008


Era uma vez uma doce e meiga garotinha loirinha, magricela e dentuça. Ela tinha sete anos quando uma amiga foi brincar em sua casa e elas decidiram brincar de pular na cama. A menina da nossa história, caros leitores, estava com receio de pular, mas sua amiga a obrigou. Resultado: ela bateu com a cara na janela e estourou a boca.
E assim começou sua longa e dura jornada de visitas ao dentista.
Aos oito ela começou a usar aparelho móvel. Aos dez, o fixo. cinco anos depois, e sete após o início de nossa jornada, nossa menininha finalmente retirou os ferros dos dentes. Eles estavam retinhos, perfeitos, cada qual em seu devido lugar. Mas o dentista da nossa menininha, caros leitores, não colocou nenhum tipo de ferrinho para impedir que os dentes voltassem a ficar tortos. Ele apenas a alertou que deveria realizar uma cirurgia para extrair os sisos, que ainda nem haviam nascido.
Não é preciso dizer que nossa menininha recusou.
Antes que comece qualquer tipo de julgamento quanto à decisão da nossa menininha, talvez seja necessário acrescentar que ela, durante a longa jornada de sete anos de idas e vindas mensais no consultório odontológico, havia sido submetida à extração de praticamente todos seus dentes-de-leite e dois dos permanentes. Após tantos procedimentos, alguns podem julgar que ela deveria estar habituada, mas fato é que a cada extração nossa menininha se sentia mais e mais traumatizada. Ela odiava dentistas desde a mais remota memória que conseguia extrair de sua cabecinha, quando, na tenra idade de três ou quatro anos, sua mãe a levava ao dentista para aplicações de flúor.
Foram estes os motivos que a levaram, então, a recusar abortar os sisos quando assim lhe foi sugerido. Ela ainda tinha a vã esperança de que haveria espaço em sua arcada dentária para tais dentes. Tola e pueril menininha.
Eis que, passados enfim quase quatro anos, nossa menininha viu seus dentes outrora tão bem consertados pelo uso de aparelhos se deformarem, encavalarem e entortarem até chegar ao extremo que ela jamais imaginara.
Foi uma olhada no espelho que a fez decidir: sim, agora extrairia os sisos. Deixaria os traumas, medos e revoltas para trás e, estoicamente, andaria passo a passo rumo à cadeira de dentista para, de uma vez por todas, livrar-se deste mal.
E foi de cabeça erguida que ela entrou no consultório.

pela menininha da história

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