sexta-feira, 7 de maio de 2010

[A Voz]

Postado originalmente em 17 de março de 2008


Se esta rua, se esta rua fosse minha...
Era um bosque, um bosque longo e escuro. Albert caminhava por ele, temendo algo que não sabia bem o que era. Arrepios gelados percorriam sua espinha de alto a baixo. Ele olhava ao redor, procurando o que não sabia se queria encontrar. Ele ouvira claramente a canção. Será que realmente ouvira?
Eu mandava, eu mandava ladrilhar...
Agora tinha certeza. Sim, ouvira com os ouvidos que a terra haveria de comer. Outra onda de arrepios percorreu sua espinha. De onde vinha aquela voz? Era uma voz serena, macia.
Com pedrinhas, com pedrinhas de brilhante...
Era uma voz infantil, podia assegurar. A dona daquela voz não passaria de seis anos, se os tivesse. Mas então, por que diabos mais uma onda de arrepios teimou em percorrer sua espinha ao ouvir a canção?
Para o meu, para o meu amor passar...
Albert parou de andar, tentando identificar a direção da voz. Procurou ignorar a nova e já familiar onda de arrepios que subiu até sua nuca. Olhou para os lados, em todas as direções, mas a voz parecia haver se calado.
Andou mais alguns passos na escuridão do bosque. As árvores e arbustos ao redor não passavam de vultos. O arrepio havia se alojado na nuca e de lá parecia não querer sair. Albert podia sentir suas orelhas arrepiadas, eretas, procurando qualquer ruído. Mas não havia ruído nenhum. Nem mesmo o som do vento, nem mesmo o cricrilar dos grilos. Nada.
E então não pôde mais conter o medo. Ajoelhou-se, acocorou-se, protegendo a cabeça com os braços, fechando os olhos o mais forte que podia. Tentou cantar, mas nenhuma música passou por sua cabeça. Tentou falar, mas não havia pensamentos para verbalizar. Sentia apenas medo.
E então.
Nesta rua, nesta rua tem um bosque...
A onda de arrepios fê-lo levantar num instante. Olhos abertos, procurou a origem da voz. Seu coração batia com tanta força que era capaz de sentir o sangue pulsando em suas têmporas. Tentou falar. Quem era?, ele perguntaria. Mas a voz não saiu. Tentou mais duas ou três vezes, mas o som não saía.
Que se chama, que se chama solidão...
Começou a correr. Não pensara nisto, apenas corria. Tropeçou em raízes, caiu algumas vezes, mas continuou correndo. Chegaria ao fim daquilo, sabia que chegaria. Precisava chegar.
Então caiu. Caiu e continuou caindo por alguns momentos antes de chegar ao chão.
Dentro dele, dentro dele mora um anjo...
Estava exausto. Jamais conseguiria sair dali. Deixou o rosto colado à terra e às folhas secas ao chão durante o silêncio. Podia ouvir agora seu coração bater. Manteve os olhos fechados.
Que roubou, que roubou meu coração...
Uma luz invadiu suas pálpebras fechadas. Teve medo de abri-las. Permaneceu imóvel, sentindo o arrepio correr sua espinha e atravessar seus órgãos.
E então não sentiu mais medo.

(continua...) 

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